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Migalhas veicula artigo assinado pelos associados Alexandre Jabra e Daniela Geib sobre desafios na demarcação dos territórios tradicionais no Brasil

18/06/2025

Artigo veiculado no Migalhas.

Autores: associados Alexandre Jabra e Daniela Geib, do grupo Meio Ambiente, Mudanças Climáticas e Sustentabilidade

A demarcação dos territórios tradicionais no Brasil e os seus desafios práticos

Questões sobre terras indígenas e quilombolas, entraves legais, lentidão nos processos e impactos na segurança jurídica e nos investimentos privados.

No Brasil, a proteção dos territórios tradicionais, que engloba terras de povos indígenas, quilombolas e demais comunidades tradicionais, é um tema de grande relevância para evitar o agravamento de conflitos e propiciar a segurança jurídica para os negócios e investimentos nas áreas envolvidas.

A FUNAI – Fundação Nacional dos Povos Indígenas é a principal responsável por conduzir esses processos para as terras indígenas. asno caso das comunidades quilombolas, o INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária desempenha um papel semelhante. Também existem mecanismos de monitoramento e fiscalização para garantir que os direitos dessas comunidades sejam respeitados, incluindo a atuação do MPF – Ministério Público Federal e de organizações não governamentais.

Ocorre que a demarcação dos territórios envolve um processo complexo que inclui a identificação, demarcação e homologação desses territórios. De acordo com dados de 2023 divulgados pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, das mais de seis mil comunidades quilombolas espalhadas pelo Brasil, 147 tiveram o respectivo título emitido.

Além disso, dados divulgados em março de 2025 pela FUNAI indicam que, das 631 terras indígenas no Brasil, 150 estão em fase de estudo, ou seja, fase preliminar em que são realizadas análises antropológicas, históricas, cartográficas e ambientais.

Dentre os principais obstáculos existentes na demarcação nos territórios tradicionais, destacam-se a morosidade dos processos de demarcação – que muitas vezes se arrastam por anos ou até décadas, e que pode ser atribuída, principalmente, a fatores burocráticos – bem como a falta de recursos e conflitos fundiários. Essa situação estimula a insegurança jurídica e prejudica negócios desenvolvidos nessas áreas, dada a instabilidade e falta de previsibilidade para a realização de operações e investimentos.

Em 2023, foi elaborado um estudo pela Terra de Direitos argumentando que, caso o Estado brasileiro permanecesse com o mesmo ritmo de regularização fundiária dos territórios quilombolas seriam necessários 2.188 anos para titular integralmente os processos existentes à época.

No mais, de acordo com dados divulgados pelo ISA – Instituto Socioambiental, em 21 de fevereiro de 2024, quase metade das 46 terras indígenas delimitadas pela FUNAI aguardam há mais de 10 anos a edição de suas portarias declaratórias pelo Ministério da Justiça.

Dessa forma, é notória a existência de um passivo na demarcação dos territórios tradicionais no Brasil. Os órgãos competentes ao longo dos anos têm sinalizado que algumas medidas estão sendo adotadas, mas fato é que ainda há muito trabalho a ser realizado.

Recentemente, o MPF tem atuado de forma mais ativa na defesa da demarcação dos territórios tradicionais, através da expedição de recomendações aos órgãos competentes, como a FUNAI e o INCRA, realização de audiências públicas, bem como ajuizamento de ações judiciais.

Em algumas ações ajuizadas pelo MPF, o Poder Judiciário já decidiu pela imposição de prazos para conclusão da demarcação de territórios tradicionais, porém, tais decisões vem sendo alvo de críticas.

Um exemplo dessa situação é a decisão recente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região que julgou procedente o pedido do MPF para condenar a União e a FUNAI a adotarem as medidas necessárias à conclusão do processo de demarcação da terra indígena Guanabara, localizada nos municípios de Assis Brasil e de Sena Madureira, no Estado do Acre, no prazo máximo de 24 meses. Porém, representantes da União e FUNAI alegam que a decisão caracterizaria uma interferência indevida do Judiciário em violação ao princípio da separação dos poderes.

O tema ainda gera muitas discussões e novas questões são constantemente levantadas. A nosso ver, o que mais se destaca é o argumento de que os prazos impostos pelo Poder Judiciário podem ser efetivamente inviáveis. Afinal, o processo de demarcação de terras tradicionais envolve estudos técnicos complexos, consultas às comunidades afetadas e a análise de documentos históricos.

Como consequência prática, a imposição de prazos insuficientes pelo Poder Judiciário aos órgãos competentes pode resultar em prejuízos às comunidades tradicionais e à iniciativa privada, em decorrência de uma análise inadequada dos casos que pode, por exemplo, comprometer a qualidade e a precisão dos processos de demarcação. A pressa para cumprir com esses prazos concomitantes pode levar a erros e omissões que podem agravar conflitos fundiários já existentes.

Dessa forma, é essencial que os prazos para a demarcação das terras tradicionais sejam realistas e compatíveis com a complexidade dos processos envolvidos para que, na tentativa de solucionar o problema, não agrave o a situação já existente, e gere mais insegurança para os stakeholders envolvidos.

 

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