Covid- 19 e seu impactos nas relações comerciais
Por Marcia Calafate e Marcel Nunes, sócia e associado dos grupos de Comércio Internacional, Contratos Comerciais, Fusões & Aquisições, Imobiliário, Societário de Trench Rossi Watanabe, respectivamente
A pandemia do coronavírus, no âmbito legal, tem impacto direto nas relações comerciais, especialmente aquelas que envolvem a entrega de um produto ou prestação de um serviço, a exemplo da compra e venda, fornecimento, distribuição, disponibilização de serviço, infraestrutura, consultoria, promoção etc.
As relações envolvendo empresas são as mais afetadas, pois elas são o cerne do chamado “supply chain“, ou seja, da cadeia de fornecimento, envolvendo desde o momento de desenvolvimento de um produto ou serviço, até a sua especificação, fabricação, disponibilização, promoção, venda, entrega e pós-venda. Se um elo dessa cadeia for afetado, todos os demais elos serão, de alguma forma, prejudicados e deverão ser revisados.
A partir do momento em que a expectativa de um fornecimento ou entrega é frustrada, se faz necessário analisar as consequências para toda a cadeia e, especialmente, os riscos inerentes a esse descumprimento para as partes afetadas. Pode se tratar de um caso de descumprimento gerador de multa ou penalidade ou, porventura, de rescisão contratual sujeita à indenização. Importa, também, verificar se o contrato ou a lei aplicável permite invocar algum tipo de excludente de responsabilidade, como seria, por exemplo, a força maior.
Em tempos de Covid-19, não necessariamente todos os descumprimentos são justificados pela força maior e, portanto, não é sempre que a parte terá uma desculpa razoável para não cumprir a sua obrigação ou se eximir de responsabilidade. Embora não seja a praxe, de acordo com a Lei Brasileira, seria possível que uma parte assumisse plena responsabilidade, inclusive na hipótese de ocorrência de um evento de força maior ou de caso fortuito. Em alguns outros casos, não se trata de puro descumprimento, mas cumprimento sujeito à onerosidade excessiva, situação essa que também merece endereçamento cuidadoso.
Por outro lado, há que se considerar que determinadas obrigações podem ser justificadamente postergadas em nome da força maior, mas isso não quer dizer que serão perdoadas ou não deverão ser executadas posteriormente. É imperioso que se faça uma análise caso a caso da relação impactada pelo momento atual para que a empresa tome conhecimento dos riscos a que está sujeita e suas eventuais alternativas e mitigadores para que, assim, possa tomar uma decisão informada. Dentro do possível, deve-se buscar uma renegociação e revisão do contrato, ficando para última instância a rescisão contratual. Isso porque, na eventualidade de uma disputa, entendemos que os juízes e árbitros levarão em consideração a boa-fé das partes para a busca de uma solução intermediária diante das circunstâncias.